segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Palavra




Pudemos colocar a fé onde nos é permitido
ou seja a meio do caminho onde só passam as crianças
e os trespassados
e os desalojados
e os desprezados
e os que por abrigo escolheram o céu nocturno
para abrir os olhos da tempestade que é estar nu
e se transformaram em gente imensamente rica
porque puderam fechar os buracos negros da memória
transformar os erros em clarividentes metáforas
a sujidade em branco amanhecer
e esquecer…
a minha direcção é entre esse vento norte
e a verdade que tudo magnetiza
medusas estelares
cidades costeiras precipitas pelo grito oceânico
constelações iluminadas na intensidade
dos teus olhos boreais
os passos em volta do meu nome
levantado entre império nenhum e as mãos abertas
sobre as nossas frágeis vidas
atiro-me contra as paredes futuras de nossa Casa
sonho um coração felpudo feito de espuma estrutural
e asas de borboletas azuis
escrevo o canto do pássaro matinal cheio de folhas
e a ternura desmedida do meu cão
e sobretudo
o meus sangue sentido no afecto das tuas mãos de vidro crepuscular
e não preciso de metáforas
para escrever o que é centro no poema
onde suavemente irrompe o que sempre será
a boca encontrada no silencio da busca
um lugar onde se podem queimar os erros do passado
um ballet de intangíveis luzes para pernoitar no abandono do corpo
dias e noites demasiadas
numa única palavra
que não precisa de ser dita de tão evidente.

14 comentários:

vieira calado disse...

Gostei muito do poema.
"Até porque tem muito de poema de intervenção", coisa que não é muito comum, nestes dias.
Um abraço

Maria disse...

Sabes que gosto de te ler. Porque a tua escrita é "inquieta".
Gosto da tua "inquietação"...

Beijo
(eu aquietava-me se vivesse aí...)

ruth ministro disse...

Mais um poema de estrutura invulgar e conteúdo forte, marcante.

Gostei muito.

Ad astra disse...

"sonho um coração felpudo feito de espuma estrutural
e asas de borboletas azuis"

originalmente...lindo
o que vindo de ti, não é original

um beijo

Ad astra disse...

(passa lá, tem uma coisa para ti)

... a cada instante ... disse...

Percorremos caminhos vazios. Caminhamos em solidão. Tentamos esquecer o Ontem e fugimos do Amanhã.
Que desassossego... Parabéns.

Graça Pires disse...

Quando a poesia tem um sinal de sentido obrigatório, um poema assim é "um lugar onde se podem queimar os erros do passado".
Excelente, o poema.
Um abraço.

Carla disse...

inquietação e serenidade...gostei muito pela ambivalência dos sentimentos que este pema provocou

Carol disse...

Um poema de dicotomias bem marcadas. Gostei de o ler.

maria josé quintela disse...

entre o vento norte e a verdade



a tua palavra.



um lugar difícil!

SMA disse...

Esse caminho do meio
teu tão diferente
tao teu
.
.
.
tão pouco nosso
.
.
bjo grande

Manuela Viola disse...

Gostei muito!
Bjo.

tchi disse...

Caminho de silêncio.

Abraço.

Anónimo disse...

Forte...