
William Blake
Gaveta e luz
que te não abro
para não cegar de vez
Gaveta de luz
onde guardo a brancura
com que pinto este papel a palavras negras
Gaveta de luz
espuma destes dias
mar de púrpura flor
água sonhada
e tantas vezes respirada
Gaveta de luz
nau petrificada
que somente aos corvos pertences
livro do sal e da areia
esta minha terra
litoral de dunas devoradas
vertigem de morder os dedos
o medo visível somente ao entardecer
o silencio lunar do corpo
entregue á mansidão do esquecimento
pétalas de fecharmos os olhos
num precipício perfumado
gaveta de luz
lençol onde termina o sofrimento dos lábios
abertos pela treva oceânica
gaveta de luz
onde nos abraçamos
no momento único
de nos recordarmos até ao fim.